Márcio Valentir Ugliara*
O pagamento de juros sobre o capital próprio (JCP) é uma forma de remuneração aos sócios ou acionistas pelo montante financeiro aportado e mantido na sociedade, o que é feito a título de compensação por deixarem o numerário à disposição da organização empresarial, uma vez que tais valores estão empregados na atividade operacional da sociedade e não podem ser objeto de aplicação no mercado financeiro. Trata-se de um estímulo da lei à atividade empreendedora.
Ressalta-se haver um relevante ganho tributável em se pagar o JCP ao sócio pessoa física, sendo forma de remuneração mais vantajosa que a sistemática de dividendos, uma vez que o JCP é contabilizado como despesa dedutível, ou seja, deixa de ser tributado na apuração do lucro da pessoa jurídica. Ao ser deduzido no lucro e estar preservado da tributação no regime do lucro real, se computados todos os tributos incidentes diretamente sobre a atividade empresarial temos em um primeiro momento uma economia fiscal de cerca de 34%. Por segundo, considerando-se que o JCP é tributado à alíquota de 15% como IRRF do beneficiário, temos que o ganho tributário final é de aproximadamente 19% em relação ao pagamento de dividendos (34% de ganho na dedução de despesas – 15% de IRRF).
O JCP tem regramento jurídico pela Lei nº 9.249/95, artigo 347 do RIR/1999, Instrução Normativa 11/96 e 93/97 da Secretaria da Receita Federal e Deliberação CVM nº 207/96, sendo importante a análise das disposições normativas para correto enquadramento da natureza jurídica e situação dos juros sobre capital próprio em nossa legislação.
O artigo 9º da Lei nº 9.249/95 determina a contabilização do JCP como despesa dedutível, sendo o valor pago imputado como dividendo, na forma do artigo 202 da LSA, estando sujeito à tributação de 15% (quinze por cento) como imposto de renda retido na fonte. Nesse sentido:
Art. 9º A pessoa jurídica poderá deduzir, para efeitos da apuração do lucro real, os juros pagos ou creditados individualizadamente a titular, sócios ou acionistas, a título de remuneração do capital próprio, calculados sobre as contas do patrimônio líquido e limitados à variação, pro rata dia, da Taxa de Juros de Longo Prazo – TJLP.
§2º Os juros ficarão sujeitos à incidência do imposto de renda na fonte à alíquota de quinze por cento, na data do pagamento ou crédito ao beneficiário.
§7º O valor dos juros pagos ou creditados pela pessoa jurídica, a título de remuneração do capital próprio, poderá ser imputado ao valor dos dividendos de que trata o art. 202 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, sem prejuízo do disposto no § 2º.
O art. 9º da Lei nº 9.249/95, e 29 a 31 da IN 11/96 estabelecem os pressupostos para o pagamento do JCP:
a) Opção pelo Lucro Real;
b) Existência de lucros, computados antes da dedução dos juros,
ou de lucros acumulados e reservas de lucros, em montante
igual ou superior ao valor de duas vezes os juros a serem
pagos ou creditados;
c) Disponibilidade de caixa da sociedade para efetuar o
recolhimento dos 15% IRRF incidente na data do pagamento
ou crédito aos acionistas;
d) Contabilização em contrapartida de despesas financeiras.
A retenção de imposto de renda na fonte será considerada tributação definitiva no caso de beneficiário pessoa física ou pessoa jurídica não tributada pelo lucro real, e antecipação do devido na declaração de rendimentos de pessoa jurídica tributada pelo lucro real, sendo que nesse caso poderá compensar com o retido por ocasião do pagamento ou crédito de juros, a título de remuneração de capital próprio, a seu titular, sócios ou acionistas (artigo 9º, §3º e 6º da Lei nº 9.249/95).
Vale ainda destacar que a lei 9.532/97 preve insenção de tributação do JCP para fundos de investimento, clubes de investimento, carteiras administradas ou qualquer outra forma de investimento associativo ou coletivo (Arts. 28, 33 e 81 da Lei nº 9.532/97), tudo como forma de incentivar a atividade empreendedora financeira no país.
Em sentido diametralmente oposto, a alíquota do imposto retido passa para 25% nos casos de beneficiários residentes em “paraísos fiscais”, tudo de acordo com o artigo 13 da instrução normativa 252/02 e 188/02 da Receita Federal. Mesmo nessas hipóteses, ainda há ganho tributável em relação a dividendos, se analisado isoladamente.
No tocante ao cálculo do JCP, utiliza-se como índice a Variação da Taxa de Juros de Longo Prazo – TJLP, pro rata dia, instituída pela Lei n o 9.365, de 1996, adotando-se como base as contas do patrimônio líquido. No tocante a base de cálculo, a Lei 12.973/2014 alterou a legislação tributária, de modo que temos que considerar dois critérios:
No primeiro, para os anos-calendário de 2008 a 2014, a pessoa jurídica poderá utilizar as contas do patrimônio líquido mensurado de acordo com as disposições da Lei nº 6.404/1976 e alterações posteriores, observando-se que, no cálculo da parcela a deduzir, não serão considerados os valores relativos a ajustes de avaliação patrimonial.
Dessa forma, os juros remuneratórios do capital próprio serão calculados sobre as contas do PL, composto pelas contas de:
a) capital social;
b) reservas de capital;
c) ajustes de avaliação patrimonial;
d) reservas de lucros;
e) ações em tesouraria; e
f) prejuízos acumulados
Na composição da base de cálculo, deve-se excluir a conta de reserva de reavaliação, salvo se esta for inclusa na determinação da base de cálculo do imposto de renda e da contribuição social sobre o lucro líquido, tudo por força do artigo 9º, “caput” e §8º da Lei nº 9.249/95, bem como da reserva especial relativa à correção monetária especial das contas do ativo, apurada na forma do Decreto n o 332, de 1991, com base no IPC, prevista no art. 460 do RIR/1999.
No segundo critério, aplicável a partir de 01.01.2015, conforme o art. 9º da Lei nº 9.249/1995, com a redação dada pelo art. 9º da Lei nº 12.973/2014, a legislação tributária relaciona as contas que integram a base de cálculo da remuneração dos juros sobre o capital próprio. Nesse sentido, a contar de 1º.01.2014, no caso de opção pela aplicação antecipada do novo regime tributário previsto no subtópico 2.1.2 ou, a partir de 1º.01.2015, para fins de cálculo da remuneração dos juros sobre o capital próprio, serão consideradas exclusivamente as seguintes contas do Patrimônio Líquido:
a) capital social;
b) reservas de capital;
c) reservas de lucros;
d) ações em tesouraria; e
e) prejuízos acumulados
Por fim, primordial observar-se que por expressa disposição do artigo 29 da Instrição Normativa 93/97 da Receita Federal, o JCP encontra limite no maior dos seguintes valores:
a) 50% (cinqüenta por cento) do lucro líquido do exercício antes da dedução desses juros; ou
b) 50% (cinqüenta por cento) do somatório dos lucros acumulados e reserva de lucros.
Anote-se que o lucro líquido do exercício mencionado no item a) será aquele após a dedução da contribuição social sobre o lucro líquido e antes da dedução da provisão para o imposto de renda.
No sentido das questões acima, o JCP é uma forma lícita de remunerar o capital com encomonia fiscal, sendo que a retenção fiscal na fonte gera uma aparente onerosidade superior ao pagamento de dividendos, porém a análise dos pormenores legais permite concluir pelo benefício dessa figura jurídica e a necessidade de observância das alterações legais havidas.