Quem usa internet pelo celular já está acostumado com o aviso sobre a redução da velocidade quando o limite do pacote de dados é atingido. Agora, a medida pode atingir também a internet fixa – aquela usada pelos usuários em casa ou no trabalho. Uma prática de mercado que começou a ser utilizada este ano passou a limitar a níveis menores do que antes o tamanho do pacote de dados dos usuários de telefonia fixa, da mesma forma como já acontecia com a telefonia móvel. Esse “tamanho” é a chamada franquia de dados.
Funciona da seguinte forma: com a franquia menor, o pacote de internet poderia terminar depois que usuário assistisse a cerca de 10 vídeos no Youtube ou 10 episódios de alguma série em um serviço de streaming, como o Netflix. Depois que o consumidor atinge o limite da franquia, a internet é cortada ou diminui drasticamente sua velocidade até o mês seguinte.
Associações de defesa do consumidor manifestaram-se contra a prática, que gerou reações também de organizações da sociedade civil, além de campanhas nas redes sociais. Uma petição online no site da Avaaz contra o limite na franquia de dados da banda larga fixa já está próxima de alcançar 700 mil assinaturas e a página do Movimento Internet Sem Limites já alcançou mais de 260 mil seguidores em sua página do Facebook.
De acordo com o Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), o novo modelo de pacote de dados tem sido adotado principalmente pela Vivo, mas o temor é que ela seja seguida por outras operadoras.
“As principais empresas do setor de telecomunicações e banda larga passaram a criar novos pacotes, novos planos para os seus usuários, com franquias de dados muito menores, especialmente a Vivo”, informou Rafael Zanatta, pesquisador em telecomunicações do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), em entrevista ao programa Ponto Com Ponto Br, da Rádio Nacional de Brasília!, produzido em parceria com a equipe do Portal EBC. Questionada, a operadora informou, em nota, que “a franquia de consumo de dados de internet fixa já é praticada hoje por alguns dos principais players de banda larga fixa”.
O Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia e de Serviço Móvel Celular e Pessoal (SindiTelebrasil) informou que não se pronunciaria sobre a mudança, já que dizia respeito a empresas específicas e não a decisões do setor.
A Vivo afirmou que os usuários ADSL (antigo Speedy) que comprarem o pacote até o dia 4 de fevereiro deste ano terão seus contratos mantidos e aqueles que adquiriram o plano a partir do dia 5 do mesmo mês estão sujeitos ao novo contrato. Já para os usuários GVT e Vivo fibra, os contratos serão mantidos para quem aderiu até o dia 1° de fevereiro deste ano. Para quem está sujeito ao novo contrato a empresa promete a manutenção do serviço de internet sem bloqueio, mesmo após o término da franquia de dados contratada em condição promociaonal até o dia até 31 de dezembro.
“À medida em que isto vier a ocorrer no futuro, a empresa fará um trabalho prévio educativo, por meio de ferramentas adequadas, para que o cliente possa aferir o seu consumo”, diz a nota.
O Idec alerta que as empresas têm adotado uma estratégia para modificar contratos em andamento oferecendo ao usuário mais velocidade na internet pelo mesmo preço da assinatura, mas reduzindo a franquia. “O fato de as empresas modificarem seus contratos sem apresentarem uma justificativa técnica de porque elas precisam reduzir essas franquias implica em violação do código de defesa do consumidor”, afirmou Zanatta.
Defesa do consumidor
Nesta semana, o Idec deve lançar uma campanha para alertar sobre os riscos que a redução da franquia representa para os usuários de internet. O Instituto manifestou a preocupação ao Ministério da Justiça, em fevereiro, durante uma reunião do grupo de trabalho sobre comunicações da Secretaria Nacional do Consumidor.
“Tem que fazer uma pressão muito grande em cima das empresas para que elas justifiquem esses novos contratos terem franquias tão baixas e pressionar também os orgãos de proteção dos direitos do consumidor, além da Anatel”, disse o pesquisador.
Marco Civil da Internet
Desde 2014, o Marco Civil é a legislação que disciplina o uso da internet no Brasil. Para o pesquisa do do Idec, a redução da franquia de internet fixa está em desacordo com pelo menos dois pontos da legislação. Um deles assegura ao usuário “o direito de não suspensão da internet a não ser por débito decorrente da utilização”.
O outro é o conceito da neutralidade da rede. Isso significa que os prestadores de serviço de conexão à internet não podem ter conhecimento sobre o tipo de dado utilizado pelo usuário, nem pode privilegiar um tipo de dado em detrimento de outro. Ainda é proibido cobrar de modo diferenciado pelo tipo de consumo feito.
“Eles querem criar excessões para a regra de neutralidade de rede para oferecer serviços que não vão computar dados, não vão ter franquia de dados. O que está por trás dessa mudança é uma estratégia muito agressiva de segmentar os consumidores por capacidade de compra, de prejudicar os consumidores que fazem compra por serviço de aplicações, que consomem bastante dado”, afirmou o Rafael Zanatta.
Anatel Suspende Corte ou Redução de Internet Fixa Após fim da Franquia
Uma decisão cautelar da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) impede temporariamente as operadoras de internet fixa de reduzir a velocidade ou suspender a prestação do serviço de banda larga após o término da franquia prevista.
A decisão vale até que essas empresas forneçam aos consumidores ferramentas que permitam, por exemplo, acompanhar o uso de dados de seus pacotes. Ou seja, dentro de alguns meses, as operadoras vão voltar a ser liberadas para fazer os cortes de sinal – se isso estiver previsto no contrato com os clientes.
O despacho da agência com a cautelar foi publicado na edição desta segunda-feira (18) do Diário Oficial da União. O descumprimento pode gerar multa de R$ 150 mil por dia, até o limite de R$ 10 milhões às operadoras.
As novas determinações
O despacho da Superintendência de Relações com os Consumidores da Anatel, publicado na edição desta segunda-feira do “Diário Oficial da União”, determina que as empresas de telefonia não podem reduzir a velocidade, suspender o serviço ou fazer cobrança de tráfego excedente após o esgotamento da franquia – mesmo se isso estiver previsto em contrato – até que cumpram as condições estabelecidas pela agência reguladora.
Entre as condições definidas pela Anatel está a comprovação, por parte da operadora, de que disponibilizou aos clientes ferramentas que permitam o acompanhamento do consumo do serviço, o histórico da utilização e a notificação quanto à proximidade do esgotamento da franquia, além da possibilidade de comparar preços.
Também é necessário, segundo a Anatel, que a operadora deixe explícito em sua oferta e nas publicidades a existência e o volume de eventual franquia nos mesmos termos e com mesmo destaque dado aos demais elementos essenciais da oferta, como a velocidade de conexão e o preço.
As operadoras terão que comprovar à Anatel que adotaram as medidas. Em seguida, a agência vai publicar um ato reconhecendo o cumprimento das condições. Só depois de 90 dias desse ato é que as empresas serão liberadas para restringir o serviço de internet fixa (suspender ou reduzir o sinal), nos casos de contratos por franquia que prevejam essa possibilidade.
Fonte: Agência Brasil e Portal G1 – 18/04/2016